Norma abarca espécies de interesse ambiental, desburocratiza setor e prepara o Brasil para a recuperação da vegetação nativa.
O processo de produção e comercialização de sementes está mais ágil. Para conferir maior dinamicidade e vantagens competitivas aos produtores, a instrução normativa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que regulamentava o setor (IN nº 56, de 8 de dezembro de 2011) foi revista e uma série de procedimentos desburocratizada.
As alterações também preparam o Brasil para o cumprimento de metas de recuperação da vegetação nativa e foram discutidas no âmbito do Comissão Técnica de Sementes e Mudas de Espécies Florestais Nativas e Exóticas, composta por representantes dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), setor produtivo, pesquisadores e fiscalizadores.
A nova IN do MAPA (nº 17, de 26 de abril de 2017, retificada pela nº 19, de 16 de maio de 2017) visa garantir procedência, identidade e qualidade das mudas e sementes das categorias previstas.
De acordo com o diretor do Departamento de Conservação de Ecossistemas do MMA, Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, o trabalho colaborativo entre diversas instituições em torno das mudanças foi um dos méritos do processo. “Ter dois ministérios e um conjunto de atores envolvidos nessa discussão é motivo de celebração”.
Segundo ele, o ministério do Meio Ambiente defendeu uma legislação que adotasse uma abordagem gradativa no aumento dos requisitos de qualidade. “A IN acabou indo nessa direção de, ao mesmo tempo, cobrar qualidade, mas sem inviabilizar a participação dos interessados”, afirmou.
O objetivo da revisão foi solucionar os principais gargalos para a produção de sementes e mudas florestais, sem fugir da legalidade, segundo o diretor do Departamento de Fiscalização de Insumos Agrícolas (DFIA), da Secretaria de Defesa Agropecuária do MAPA, André Peralta. “Foi um processo bastante democrático e participativo”, disse.
A revisão dá suporte à implantação da Lei de Proteção da Vegetação Nativa (nº 12.651, de 25 de maio de 2012), em especial com relação à rastreabilidade do material produzido, permitindo aumentar a oferta de sementes e de mudas voltadas à recuperação de áreas do passivo ambiental.
Ela também contribuirá para o fortalecimento de uma cadeia econômica da recuperação da vegetação nativa de modo a atender aos requisitos da regularização ambiental de imóveis rurais brasileiros prevista no Cadastro Ambiental Rural (CAR), considerado uma ferramenta importante para auxiliar no planejamento do imóvel rural e na recuperação de áreas degradadas.
“Quando o CAR for validado, vamos saber com mais precisão o passivo ambiental, sobretudo em áreas de preservação permanente (APPs), que precisam ser recuperadas, o que será uma sinalização consistente para o setor”, explica Carlos Alberto de Mattos ScaramuzzaScaramuzza.
Além de responder a demandas de segmentos do setor florestal, agricultores e órgãos ambientais, as mudanças podem ajudar no cumprimento das metas de restauração assumidas pelo Brasil em compromissos internacionais, como a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) ao Acordo de Paris, no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), pela qual o país se compromete a restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de floresta até 2030.
Ademais, a nova IN também apoiará a contribuição do governo brasileiro ao Desafio de Bonn e à Iniciativa 20x20, anunciada em dezembro passado, no México, durante a 13ª Convenção das Partes sobre Diversidade Biológica (COP 13), pelos ministros do Meio Ambiente, Sarney Filho, e do MAPA, Blairo Maggi.
No âmbito do Desafio de Bonn, a contribuição nacional voluntária é, até 2030, restaurar, reflorestar e induzir a regeneração natural de 12 milhões de hectares de florestas para múltiplos usos e implementar 5 milhões de hectares de sistemas integrados que combinem lavoura-pecuária-floresta. , Já a contribuição voluntária do Brasil à Iniciativa 20x20 inclui a recuperação de 5 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2020.
A nova IN já se insere no contexto da implementação da Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Proveg), instituída pelo Decreto nº 8.972, de 23 de janeiro de 2017, pois está diretamente ligada a uma das diretrizes que o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), a ser lançado em breve, deverá contemplar: o fomento à cadeia de insumos e serviços ligados à recuperação da vegetação nativa.
“A simplificação dos processos administrativos ligados a coletores de sementes e viveiros é uma etapa fundamental para a gente conseguir produzir sementes e mudas na escala adequada para atender a uma demanda tão grande quanto as que as metas colocam”, disse Sacaramuzza.
A cadeia produtiva de sementes e mudas tem nas redes um elo forte. De acordo com o coordenador do Programa Xingu do Instituto Socioambiental, Rodrigo Junqueira, elas possibilitam um modelo de negócio social com promoção de conhecimento local, conservação da biodiversidade, aprimoramento da qualidade de vida familiar e fortalecimento das relações de cooperação e da organização social dos grupos familiares e comunitárias de coletores de sementes.
Ele participa do conselho curador da Associação Rede de Sementes do Xingu, parte do Programa Xingu do Instituto Socioambiental (ISA). Em dez anos, a organização recuperou 5 mil hectares de áreas degradadas na região do Xingu Araguaia, do Cerrado e da Amazônia. No período, a rede contabilizou 174 toneladas de sementes coletadas e beneficiadas por 450 coletores. A renda gerada no período gira em torno de R$ 2,5 milhões para as comunidades.
Para Junqueira, existe um caminho de adequação para flexibilizar, com responsabilidade e mais eficiência, o processo de produção de sementes e mudas florestais nativas, sobretudo com base comunitária. “O trabalho da Comissão Técnica, que contou com nossa contribuição, ajudou a dar mais um passo na caminhada”, afirmou.
A Rede Mata Atlântica de Sementes Florestais também participou da Comissão que discutiu a revisão da IN 56/2011. Em fase de reestruturação e dedicada a apoiar outras experiências na formulação de políticas públicas, geração de material didático, capacitação e recursos humanos, ela tem como uma das participantes a professora Fátima Piña-Rodrigues, professora titular do Departamento de Ciências Ambientais da Universidade Federal de São Carlos.
De acordo com ela, as redes atuam com o conceito de semente socioambiental e o seu trabalho, muitas vezes mantido por comunidades tradicionais, garante a diversidade das espécies ofertadas. “Esse é um papel que os pequenos cumprem muito bem. Não estamos falando de semente agrícola, mas das florestais e suas especificidades”, explicou.
Para Scaramuzza, o aquecimento no mercado de mudas e sementes vai se configurar como mais uma frente de atuação para assentados, populações indígenas e outras, que atuam com a semente socioambiental. “Esses atores precisam ser valorizados e, mais à frente, ser alvo de políticas de incentivo. Estamos estudando, em parceria com o Serviço Florestal Brasileiro e a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, a criação de uma política de compras públicas para aquisição de sementes e mudas de espécies nativas produzidas pela agricultura familiar e populações tradicionais. O processo de consolidação dessa cadeia não se encerra com a revisão da instrução normativa”, enfatizou.
Fonte: www.mma.gov.br